Débora e Patrícia permaneceram abraçadas e com as lágrimas a
escorrem-lhes pelo rosto uns longos minutos, sem que uma única palavra fosse
trocada.
Patricia levantou-se
da cama, secou as lágrimas e Débora repetiu o gesto.
- Eu não sei o que fazer Pathy…- Débora falou por fim.
- Tens que…contar-lhe Debs…
- Não! Não, não, não! Não posso…
- Mas porquê? O que pretendes fazer? Fingir que está tudo
bem, até ao dia em que te fores embora, não lhe dizes nada e pronto,
simplesmente vais sem te despedires dele?
- Não, claro que não…no dia em que me for embora, eu falo
com ele…deixou-lhe uma carta, algo.
- Débora, as coisas não são assim. Vais magoá-lo, vais
magoá-lo tanto! Eu não posso permitir isso, desculpa, mas ele é meu irmão…
- Não Patricia, por amor de deus não lhe contes! Eu sei que
ele é teu irmão, mas, mas…se eu lhe contar ele…ele nunca mais vai falar comigo,
nunca mais me vai querer ver à frente!
- Isso não pode ser assim! Obvio que ele vai falar contigo,
mas a partir do momento em que lhe mentes, em que lhe escondes isto, é normal
que ele vá ficar chateado, fulo! Ele ama-te, ele ama-te tanto, ele daria tudo
por ti, e é assim que lhe agradeces?
- Não Pathy, não digas isso, o meu coração já está desfeito
em demasiados pedacinhos…
- Tu não percebes? Ele não te ama como uma irmã, ele…ele
está apaixonado por ti Débora, sempre esteve, e eu…eu sempre soube, sempre
consegui decifrar isso dos seus olhos, mas ele…ele descobriu à pouco tempo. Ele
é meu irmão gémeo, e eu conheço o meu gémeo…tu vais magoá-lo, e eu não posso simplesmente
deixar que isso aconteça, não está certo, ele não merece isso, não depois de
tudo aquilo que tem feito por ti…
Débora não sabia mais o que havia de dizer. Patrícia estava
certa, completamente, mas ela, ela não conseguia simplesmente chegar ao pé de
Zayn e dizer-lhe que o ia abandonar.
- Eu…eu devia de ir embora…- disse por fim pondo-se de pé e
seguindo até à porta. Patricia foi até ela e agarrou-lhe no braço.
- Não, não vais a lado nenhum! Débora….vais contar-lhe?
Promete-me que vais…
- Eu não…não posso prometer isso…
- Porque não? É assim tão difícil?
- Tu não sabes o quão difícil é…não fazes a mínima ideia, a mínima
ideia do quanto dói, do quanto dói saber que…que não tens escolha, não te dão
sequer opção, o quanto dói seres obrigada a afastar-te de tudo, de todos,
daquele que mais amas, daquele que sempre desejas-te que ficasse a abraçar-te
para sempre. Eu…eu nunca pedi nada disto…nunca ninguém me perguntou aquilo que
eu na verdade queria…nunca! – Débora começara a chorar novamente, e Patricia
que já lhe largara o braço acompanhou-a – e sabes o que é que eu diria, aqui e
agora se me perguntassem oque eu queria? Neste exacto momento? – Patricia abanou
a cabeça para que ela continuasse – Eu diria com toda a certeza que…que queria
desaparecer, morrer…- o choro alargou-se de ambas as partes – Até há cinco anos
atrás, eu era simplesmente uma miúda, uma miúda miserável que era gozada por
todos, gozada pela sua forma física, eu passava a vida sozinha, a chorar por
todos os cantos…eu nunca, nunca havia sentido na verdade, nunca havia provado o
sabor da felicidade por muito tempo, mas isso, isso até conhecer aquele que
mudou tudo, que mudou a minha vida, que me tornou numa melhor pessoa, ele, o
teu irmão…Ele chegou lá como que caído do céu, na minha vida, ele salvou-me,
salvou-me do buraco negro em que eu estava presa e eu, eu nunca mais havia
voltado para esse buraco negro, nunca mais, até agora, até ao dia em que o meu
pai me contou que…que eu tinha que partir, para sempre…para longe dele, para
longe do meu herói! – Débora não aguentou e deixou que os seus joelhos caíssem até
ao chão como um objecto cai de cima de um balcão alto e se parte em mil
pedaços. Toda a força que ela havia reunido dentro de si para desabafar tudo
aquilo com Patricia, havia agora desaparecido, e ali, naquele momento, dentro
dela, apenas restava uma alma frágil, quase vazia e totalmente perdida.
Na verdade, Patricia acabara por ficar igualmente perdida,
perdida nos seus pensamentos. Débora estava a meter-lhe dó, toda aquela
história, ela sabia que era verdade, mas…ouvi-la contada assim, pela própria
Débora, era diferente, tornava a história ainda mais forte, mais…sentida. Ela
não queria ver o irmão sofrer, não queria vê-lo a magoar-se, não queria que
ninguém, nem mesmo a Débora o magoasse , mas ela também não queria magoar
Débora, pois ela já estava demasiado magoada e…e com todos aqueles últimos acontecimentos,
a automutilação , ela tinha medo, tinha medo que Débora cometesse qualquer
outra loucura.
À sua frente, de joelhos no chão, encontrava-se uma pessoa
que estava a sofrer, a sofrer muito e que na verdade não merecia, não merecia
nada daquilo, não merecia sofrer assim, ninguém merecia…
Patricia não teve outra opção se não ajudá-la.
- Não fiques assim Débora, por favor…eu…eu não conto nada ao
Zayn, por mais que me custe, eu não vou contar, porque…tu já sofreste tanto e…eu
não vou contar, podes ficar descansada. Se algum dia estiveres preparada para
seres tu a fazê-lo, eu vou estar lá para te apoiar, mas até esse dia, eu vou
ficar calada, podes confiar.
- A…a sério? Eu sei que…ele é teu irmão e que…não te devia
de pedir isto, mas… eu simplesmente não consigo, não tenho mais forças para
sofrer ainda mais, isto já é doloroso o suficiente. Eu…eu tenho a certeza que
ele vai…esquecer-me – ao dizer aquela palavra, o seu coração quase parou de
bater e um nó foi formado na sua garganta – vai encontrar alguém, vai conhecer
pessoas melhores que eu e que vai ser feliz...e esteja eu onde estiver, ele vai
sempre puder contar comigo.
- Ele nunca te vai esquecer Débora, disso podes ter a
certeza! Ele era uma pessoa tão diferente, até te conhecer. Não foi só ele que
mudou a tua vida, tu mudas-te a dele. Ele era um miúdo que fumava muito, que…ele
desgraçava-se e ainda era tão novo, e então…então tu apareces-te e tornaste-o
numa pessoa melhor, tornaste-o no “homem” em que ele hoje é. Tenho a certeza de
que quando te fores embora, uma boa parte desse homem vai contigo.
Aquela não era altura para se sentir feliz, mas Débora
sentiu, ela sentiu-se feliz, por Patricia lhe ter dito aquilo, lhe ter dito que
ela o havia tornado numa melhor pessoa.
- Agora vá, vamos limpar estas lágrimas e vamos lá para baixo
ter com ele. Esta conversa nunca aconteceu.
- Qual conversa? – Débora perguntou e sorriu fraco em
seguida.
- É isso…Amanhã é um grande dia para ele, e nós vamos lá
estar para apoiá-lo.
- Claro que vamos. Ao menos, ainda tenho oportunidade para
estar ao lado dele nisso. Ele tem uma voz incrível, vai arrasar, tenho a
certeza.
- O meu irmão ainda vai ser a próxima grande estrela do UK,
escreve aquilo que te estou a dizer.
- Do UK? A próxima grande estrela internacional! – Débora afirmou
sorridente e chocou a mão na de Patrícia.
Débora levantou-se do chão, recompôs-se, limpou o rosto,
ambas deram um forte abraço e saíram do quarto.
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